(Imagem: Foto tirada por mim no túnel que divide os estados de Minas Gerais e São Paulo. No lado em que estou fica a cidade de Passa Quatro, em Minas; na luz do final do túnel, está a cidade de Cruzeiro, em São Paulo. Inaugurado por D. Pedro II, este túnel foi palco da batalha mais sangrenta da Revolução de 1932. Um lugar incrível, cheio de história e reflexões.)


Quando começamos um processo psicanalítico, é como entrar em um túnel pela primeira vez.
A luz está lá no final, mas não sabemos o caminho até a saída.

Na psicanálise, nada acontece de forma repentina. Freud já falava dos processos primário e secundário:
— o primeiro, guiado pelo desejo imediato, pelo sonho, pela pulsão que busca satisfação;
— o segundo, guiado pela razão, pela realidade, pelo adiamento e elaboração.

O sujeito só se transforma quando se permite atravessar esses processos internos, que se repetem, resistem, voltam e se reconstroem.

Na clínica, isso aparece de forma quase invisível: no silêncio de uma sessão, numa palavra que retorna, num sonho que se repete. É lento, é trabalhoso. E é justamente essa lentidão que dá consistência à mudança. O inconsciente não se apressa: ele se revela em fragmentos, em lapsos, em associações que parecem desconexas.

O processo analítico é, portanto, uma travessia: o túnel onde a escuridão assusta, mas é justamente ali que os olhos se acostumam e começam a enxergar.

A neurociência, por outro lado, nos mostra que o cérebro também vive de processos.
As sinapses não se reorganizam em um dia. É na repetição, na constância, no treino da fala e do pensamento que novas redes neurais se formam.

Cada memória reativada na análise passa por um fenômeno chamado reconsolidação: ela é reaberta, reprocessada e pode ser ressignificada. É como se o cérebro dissesse: “dado antigo, mas com atualização disponível”.

Aos poucos, o sistema límbico, que guarda as marcas emocionais, encontra novos caminhos de diálogo com o córtex pré-frontal, que organiza, nomeia e planeja.
Assim, a emoção antes bruta ganha contorno, palavra, sentido.

Psicanálise e neurociência se encontram justamente nesse ponto:

  • Uma fala analisada, repetida e elaborada abre espaço simbólico no inconsciente.

  • Essa mesma fala modifica circuitos neurais, fortalecendo novas rotas de pensamento e regulando emoções.

É por isso que, tanto na clínica quanto no cérebro, o processo é lei da vida.
Não é sobre atalhos. Não é sobre “resolver rápido”.
É sobre suportar o túnel escuro até que a luz surja adiante.

A mudança acontece a cada sessão, a cada passo, a cada respiro. Algo se reorganiza dentro e fora.
O inconsciente se desloca, o cérebro se reconecta, e o sujeito se reinventa.

No fim, tanto na psicanálise quanto na neurociência, o processo não é um detalhe: é o próprio caminho da transformação.
A luz no fim do túnel e a linha de chegada não são milagres: são a prova de que houve travessia, de que houve coragem, de que houve vida sustentada passo a passo.

Juliana Oliveira - Psicanalista e Neuropsicanalista.


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